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no princípio era o prato

Um pequeno bloco de notas digitais, de avaliações de restaurantes, de viagens, de variadas recomendações e textos aleatórios.

no princípio era o prato

Um pequeno bloco de notas digitais, de avaliações de restaurantes, de viagens, de variadas recomendações e textos aleatórios.

a fortuna do douro

Admito que estou com algum receio de escrever este texto. Tenho medo de divulgar uma pérola escondida, sobre o qual tenho 0 propriedade, tendo-o descoberto apenas há uns dias. Aproveitando um fim-de-semana nortenho, mais concretamente na região do Douro (esse pequeno pedaço de paraíso que existe no nosso país e, sem sombra de dúvidas, um dos lugares mais bonitos do mundo), fui almoçar a um local muito bem recomendado, fora do circuito turístico habitual. Localizado no concelho de São João da Pesqueira, visitei por primeira vez (não será a última) o Cais da Estação da Ferradosa

Descrito como uma pérola da comida tradicional portuguesa e com um ambiente casual impressionou-me logo à primeira vista a apresentação do restaurante, moderna e cuidada. Fixei imediatamente, e tendo em conta o domingo solarengo e caloroso que nos acompanhava, no pequeno terraço repleto de mesas e de comensais, com mesas e cadeiras simples, algumas inclusivamente patrocinadas por conhecidas marcas de cerveja. Parecia uma versão ultra melhorada de um restaurante de diárias.

Depois de ultrapassados os primeiros momentos iniciais, tivemos de esperar um pouco por uma mesa ao ar livre. Enquanto esperávamos, e como um pequeno vislumbre da excelência que nos aguardava, foi-nos perguntado se pretendíamos tomar um Porto enquanto aguardávamos. A resposta foi clara e a hesitação inexistente. Seguiram-se assim cinco minutos de uma visita deslumbrante acompanhada pelo produto de excelência, ou de um produto deslumbrante acompanhado pela vista de excelência. 

Para além da vista fixei-me no público, tentando começar a avaliação do restaurante. À mesa viamos diferentes configurações de grupos, desde casais, pequenas famílias, até almoços familiares alargados. A coisa que os unia, aos olhos desta escritora, era a casualidade com que enfrentavam a refeição , o restaurante e a vista, o que poderá indicar a frequência da visita e a proximidade do respetivo dia-a-dia. 

Bebido o aperitivo e pronta a mesa, começámos a vistoria da carta (que, infelizmente, não encontrei disponível online pelo que demorou mais tempo o processo do que seria normal). Para além do couvert, com pão, azeitonas e azeite, pedimos de entrada um prato de coração de boi, tal como manda o bom gosto no Douro no verão. Apesar de o amuse-bouche inicial estar perfeitamente sem mais, o tomate trouxe a frescura necessária para o dia e para o início de uma refeição que se via pesada. Ao peso acrescentámos ainda um vinho tinto da região (espero que não estivessem a pensar que se beberia outra coisa nesta ocasião), recomendado exclusivamente pelo serviço, para acompanhar um repasto tão diferente.

Decidimos pedir, seguindo conselhos de especialistas queridos, um prato dos conhecidos peixes de rio, nomeadamente, o filete de lúcio com esmagado de batata e labrestos (espécie de grelos da região) e o pernil de porco assado.  O primeiro prato veio abismar, destacando o toque cítrico do tempero e a densidade dos filetes de peixe e a singularidade do respetivo sabor. Quanto ao pernil, há muito para dizer. A delicadeza da carne, o apuramento dos temperos, a textura das batatas e o acompanhamento com uma mostarda caseira para um toque de acidez. Uma verdadeira obra-prima.

Apesar de já estarem superados os limites digestivos do grupo, não resistimos a olhar e pedir sobremesas. Também aqui encontrámos um toque diferente, pedimos o pudim de labrestos e doce coração do douro, uma espécie de tarte, doce, acompanhada com gelado e com um ligeiro toque a vinho do Porto. 

Este último pedido, e muitos durante a refeição, foram altamente influenciados pelo serviço do restaurante, de um cuidado, simpatia e zelo extraordinário. Fomos acompanhados em todo o momento por uma equipa que não tinha medo de aconselhar e detinha uma atenção enorme ao detalhe, do grupo, do pedido e da conversa.

Assim se passou um curto almoço de 3h e meia antes de uma viagem de 4h até casa. Na viagem, a felicidade do momento e a tristeza do seu fim. O que inicialmente me pareceu um restaurante para locais, passou no fim à conclusão que era um restaurante para afortunados. 

 

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